Ficha de Leitura sobre criacao do estado
RESUMO
O ensaio tem o objetivo de
demonstrar os diferentes modos de intervenção estatal e as formas diversas que
sustentam a soberania do Estado de Sociedade e do Contrato Social de Rousseau
na medida em que o indivíduo passa a se organizar em sociedade.
Palavra-chave:
Contratualismo, Contrato Social, Pacto, Estado de Sociedade, Estado, Soberania,
povo.
1. Introdução
O Contratualismo se
desenvolveu entre os séculos XVI e XVIII e passou a analisar o indivíduo em que
se encontrava deslocado de seu estado de natureza e inserido em uma sociedade
abalizada pelo surgimento do estado civil moderno. Em resumo, a referida escola
parte de um determinado momento em que não existe o Estado, situação na qual o
indivíduo vive em seu estado de natureza, utilizando-se de leis naturais para
reger sua conduta.
Por motivos diversos,
determinados indivíduos decidem se organizar e criar a instituição “Estado”,
que tem suas regras pactuadas através de um contrato, o chamado contrato
social, que segue determinadas características de acordo com o autor analisado.
Tal contrato institui o Estado Civil Moderno e as diferentes formas de
intervenção e soberania deste (administração estatal), assim como suas
consequências e mecanismos legitimadores ante os indivíduos.
No período temos três
principais autores que abordavam o tema de maneira acentuadamente diversa,
seriam eles Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques
Rousseau, que tinham em comum a ideia de estado de natureza e a
formação do estado civil moderno de forma divergente, sendo o objetivo do
presente ensaio fazer uma explanação dos diferentes tipos de abordagem.
Entre os autores podemos
notar de forma clara que a interferência estatal na sociedade, principalmente
no tocante do exercício da soberania, é um ponto essencial para a compreensão
de como Estado intervém na liberdade do indivíduo inserido dentro de tal
artificialidade, assim como sua expressão ideal e seus mecanismos capazes de
organizar a vida em sociedade, na medida em que os indivíduos passam a se
organizar ao longo do tempo fora de um estado natural, sendo considerado
impossível seu retorno, segundo Rousseau.
Dessa forma, procuro
demonstrar as diferenças e semelhanças no tocante do exercício da soberania para
cada autor e como isso impacta no âmbito da intervenção estatal na sociedade e
qual seria sua identidade em relação aos indivíduos desta quando delimitamos
até onde iria o poder do estado e como este se daria para cada um dos autores.
2. O Contrato
para Thomas Hobbes
Na visão de Thomas Hobbes,
como sugere a clássica passagem “O homem é o lobo do homem.”, o estado de
natureza no qual o homem vive é essencialmente composto por guerras e disputas,
uma vez que a para ele o homem tem o direito fundamental à vida e para isso a
de se valer de qualquer coisa para garanti-la, sendo “mal” por natureza. Em
outras palavras, o indivíduo vive em constante estado preventivo, o que leva o
mesmo a contínuas disputas e segundo ele “...a vida do homem é solitária,
miserável, sórdida, brutal e curta.”(Hobbes, 1651).
O estado de natureza,
conforme exposto, é marcado pela constante insegurança e não é dotado da ideia
de justiça ou propriedade privada, uma vez que você só esta na posse de algo na
medida em que tem a capacidade mantê-lo. Dessa forma, em segundo momento, o
principal motivo para que os indivíduos pactuem para a formação do Estado seria
sua função básica de segurança, embora cite outras funções do estado, este é o
meio necessário para que se crie uma unidade soberana, indivisível e
irredutível.
O contrato para Hobbes
consistiria nos indivíduos abrirem mão de sua liberdade por um princípio de
precaução de sua própria conservação, como forma de sair do ambiente caótico
que viviam, assim como na passagem:
“A causa final, finalidade e
desígnio dos homens (que amam naturalmente a liberdade e o domínio sobre
outros), ao introduzir aquela restrição sobre si mesmos sob a qual os vemos
viver em repúblicas, é a precaução com a sua própria conservação e com uma vida
mais satisfeita. Quer dizer, o desejo de sair daquela mísera condição de guerra,
que é a conseqüência necessária (conforme se mostrou) das paixões naturais dos
homens, quando não há um poder visível capaz de os manter em respeito e os
forçar, por medo do castigo, ao cumprimento dos seus pactos e à observância das
leis de natureza que foram expostas nos capítulos XIV e XV.” (Hobbes, 1651).
Assim, pressupõe-se que o
indivíduo transmitiria seus direitos a alguém que iria personificar o Estado, o
Leviatã, o soberano, sendo instituído de diversas formas (instituição,
aquisição, etc.) que iria manter sua ordem por meios coercitivos se necessário,
pois o Estado para o autor não poderia em qualquer momento ser questionado, sob
pena de não mais ser soberano e retornar ao estado de natureza (guerras),
instaurando dessa forma o Estado de Sociedade.
3. O Contrato
para John Locke
O Estado de natureza para
John Locke, diferente de Hobbes, já tem certos reconhecimentos, dentre eles o
direito à vida, a propriedade privada (dá subsistência ao direito à vida)
reconhecida ante seus membros e a figura do poder punitivo proporcional a ser
exercido contra aquele que usurpar a propriedade privada (direito natural de
punir), sendo que o mesmo introduz a ideia de Lei (Leis da Natureza e Leis de
Deus).
Para ele, o homem não é
“mal” por natureza, mas se encontra em uma neutralidade, que pressupõe que ele
é bom (não necessariamente todos os homens). Isso nos leva a crer que levaram
determinados indivíduos à fazerem o pacto para a formação de um Estado são
absolutamente diversos dos de Hobbes, uma vez que o homem, no contexto daquele,
não vivem em constante conflito e não tem a necessidade de sobreviver a
qualquer custo, pois sua propriedade privada é, em tese, reconhecida e
respeitada pelos outros.
Seguindo esse raciocínio,
tem-se que o homem busca o pacto de um contrato pois no estado de natureza ele
não é livre de fato, na medida em que as Leis da Natureza e as Leis de Deus são
submetidas a eles sem qualquer influência ou consentimento. Assim, para que o
homem seja livre e faça a manutenção dessa liberdade por algum meio, no caso o
Estado, este deve participar da criação de suas próprias leis, sendo elas
estabelecidas, reconhecidas e aprovadas por meio do consentimento, em resumo,
participar da criação das leis as quais se submete.
Podemos notar também, que ao
contrário de Hobbes, para Locke o consentimento é algo primordial para que se
instaure o Estado, não havendo espaço para um exercício total por meio de uma
figura estatal personificada como o Leviatã, mas no consenso geral, pressupondo
a ideia de eleições e separação dos poderes (executivo, legislativo e
federativo).
No mesmo tocante, embora no
estado de natureza exista a legitimidade de um poder punitivo, faltam juízes
imparciais que balizam e proporcionam (concretizem) tal poder punitivo e a
criação do Estado poderia garantir o exercício de tal jurisdição. Dessa forma o
Estado só tem o papel de garantir a boa vida que o indivíduo já tinha no estado
de natureza, quando necessário, tendo um viés bem menos intervencionista no
âmbito privado que o proposto por Hobbes[1], sendo ele criador do Estado
Liberal Clássico.
Assim, para Locke, com um
estado limitado a garantir o exercício da liberdade individual, que seria
alcançado na medida em que o homem participasse da criação de um novo conjunto
de leis que regessem suas relações se instauraria pra ele o Estado de Sociedade
com viés oposto à Hobbes.
4. O Contrato
para Rousseau
Para Rousseau o desenvolvimento
do estado para se tornar algo bom se dá com uma etapa a mais, que seria o
chamado Contrato Social. Tal fase se apresenta após o Estado de Sociedade,
tendo assim o Estado de Natureza, Estado de Sociedade e o Contrato Social como
algo que viria a ser bom ante a impossibilidade do indivíduo retornar ao estado
de natureza, que seria algo bom, pois o mesmo, diferente dos autores
anteriores, considera o homem bom em sua essência.
Em sua visão, o homem no seu
estado de natureza é bom e não é um ser sociável, pois viveria em tese
isoladamente, entretanto, na medida em que houve um crescimento populacional e
uma consequente inserção do homem na sociedade, havendo o acréscimo em suas
relações sociais, a sociedade o corrompe e este passa a vislumbrar necessidades
maiores (ambição). Na medida em que essas necessidades artificiais surgem advém
dela a ideia de propriedade privada, o que considera ser o cerne da
desigualdade, pois a partir desse momento o indivíduo passaria a olhar para o
caso concreto e deixar seus princípios de lado, cobiçando o alheio.
Ante o exposto, podemos
concluir que o Estado de Sociedade é instaurado como forma de pacificar esse
problema, todavia adquire um viés supostamente igualitário, que na verdade
estaria apenas perpetuando as diferenças entre as pessoas, pois prega um
espécie de igualdade absoluta de direitos. Para Rousseau a sociedade não é
igual e seus indivíduos são gritantemente desiguais no tocante econômico, fato
esse que apenas criaria uma falsa ideia de liberdade e igualdade entre os
indivíduos, uma vez que os mesmo sempre estariam limitados pelo viés econômico,
não só no exercício participativo da política.
É justamente dessa falta de
igualdade material que nasce a necessidade de se fazer o chamado Contrato
Social, como forma de proporcionar uma igualdade material para os indivíduos e
ele se pauta em quatro preceitos que são eles: o indivíduo precisa se dar conta
que não é livre; instaurar uma democracia direita e não representativa,
participando diretamente da criação das leis; seguir a vontade geral, o que não
é a vontade de todos, mas aquilo que é certo; ter a figura do legislador, que
para Rousseau é aquele indivíduo excepcional, que teria a capacidade de
esclarecer à terceiros o que seria essa vontade geral baseada no que é certo.
Baseado nesses conceitos
Rousseau cria o conceito de soberania popular de forma o povo não mais irá
transmitir ou ceder seus direito à alguém que os represente, mas irá exercer
seus direitos naturais de forma direita e participar sem que haja terceiros que
os represente, desconstruindo também a ideia de Locke de separação dos poderes.
5. {C}Conclusão
Conforme exposição acima,
podemos concluir que existem alguns pontos comuns entre todos os autores. Todos
eles procuram demonstrar como seria o estado de natureza de um indivíduo
pré-sociedade, assim como quais seriam os motivos que os levaram a pactuar um
conjunto de regras para a formação de um Estado, que a partir das dadas
perspectivas de cada autor teria um motivo e uma forma de intervenção diferente
na vida do indivíduo.
De acordo com cada teoria
podemos observar de que forma se dá o exercício da soberania e da liberdade
para cada autor, o que impactado diretamente de acordo com o exercício natural
do indivíduo e a delimitação da atuação estatal na vida deste.
Podemos concluir que o
exercício da soberania para Hobbes se dá através da transmissão total de
direitos naturais do povo para o Estado, que se personifica na figura do
soberano, o que inclusive justificava vários regimes absolutistas no século
XVII, tornando a soberania plena e indivisível nas mãos do soberano, o que
favorecia um estado extremamente interventor e limitador de liberdades
individuais.
Por outro lado, para John
Locke não haveria a transmissão dos direitos naturais para o Estado, mas a
cessão temporária dos direitos naturais para que o povo fosse representado por
terceiros e que os mesmo atingissem a liberdade fazendo suas próprias leis (no
estado de sociedade) através de uma democracia indireta. Para ele o Estado
funcionaria basicamente dotado de um poder polícia com um intuito de
proporcionar a liberdade individual. A soberania nesse caso se daria de forma
indireta por representantes.
Já para Rousseau jamais
haveria uma transmissão ou cessão de direitos naturais do povo para o Estado,
pois a democracia iria se dar de forma direta, buscando uma vontade geral, que
por sempre buscar o certo seria sempre justa. A soberania no caso de Rousseau
seria por esse motivo inalienável, pois seria exercida de forma direta, assim
como indivisível, pois não haveria separação de poderes, pois isso fragmentaria
a vontade geral, guiada por esta como a expressão do “certo” seria ela também
infalível e absoluta (sem meio termo)[2].
Bibliografia
HOBBES, Thomas. Leviatã: OU
MATÉRIA, FORMA E PODER DE UMA REPÚBLICA ECLESIÁSTICA E CIVIL. São Paulo:
Martins Fontes, 2003.
LOCKE, John. Dois
Tratados Sobre o Governo. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
ROUSSEAU, J-j.. O
Contrato Social: Princípios do Direito Político. São Paulo:
Martins Fontes, 1999.
Vale ressaltar que
para Hobbes haveria uma transmissão total dos direitos do homem para o
soberano, já para Locke tais direito seriam apenas cedidos temporariamente,
através do exercício do direito natural do indivíduo (o voto), para que estes
fossem representados por um estado que teria limites em seu exercício.
[2] Cabe salientar que Rousseau em
alguns casos aponta um ditador como solução, caso a lógica do estabelecimento
do contrato social venha a falhar, porém essa ditadura se daria em um campo bem
específico e com um tempo determinado para acaba
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